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MPF diz que Potássio do Brasil pressiona indígenas para venderem suas áreas para permitir mineração


O Ministério Público Federal (MPF) vai continuar defendendo os direitos do povo Mura, em Autazes (a 113 quilômetros de Manaus), para garantir o reconhecimento formal do território habitado tradicionalmente há cerca de 200 anos por eles. Ontem procuradores da República e lideranças indígenas se reuniram para expor à imprensa o impacto da exploração de minério de potássio para o povo indígena. Eles denunciaram que a empresa Potássio do Brasil está pressionando comunitários para “venda” de áreas para as atividades de mineração dentro da Terra Indígena Soares/Urucurituba, ainda não demarcada pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).


O MPF já tinha ajuizado, em 2016, a Ação Civil Pública 0019192-92.2016.4.01.3200 com o objetivo de garantir a realização de consulta prévia, livre e informada para entender de que forma o empreendimento da Potássio do Brasil afetaria os indígenas em Autazes, conforme prevê a Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho (OIT).


No decorrer desse processo, relatório antropológico solicitado pelo MPF demonstrou fortes elementos de tradicionalidade e de presença dos Mura há, pelo menos, dois séculos na área em que a empresa Potássio do Brasil começou a realizar irregularmente estudos e procedimentos para exploração mineral, o que levou o MPF a entrar com a Ação Civil Pública para a constituição de grupo de trabalho para a delimitação da chamada Terra Indígena Soares/Urucurituba.


“O que pensávamos que estava sendo discutido era o impacto do empreendimento fora do território indígena. Mas, na verdade, as atividades pretendidas seriam dentro da própria terra”, explicou o procurador da República Fernando Merloto Soave. “Nesse cenário, pedimos à Justiça Federal que paralisasse todo o processo de consulta, já que existe uma demarcação a ser discutida”. O procurador ainda ressaltou que, apesar de a demarcação formal ser um procedimento necessário para conferir segurança jurídica, todo e qualquer território indígena é assim qualificado independentemente de ser formalmente demarcado, a demarcação administrativa apenas reconhece (declara) a existência deste território dos povos originários.


Durante a entrevista coletiva, o MPF destacou que está aguardando posicionamento formal da Funai sobre a criação do grupo de trabalho para dar andamento ao processo de demarcação, conforme determinado pela Justiça Federal em decisão proferida em abril deste ano. Também aguarda posição da Justiça Federal do Amazonas sobre o pedido de suspensão da consulta da Convenção 169 da OIT ao povo Mura enquanto não houver definição sobre o processo de demarcação do território indígena Soares/Urucurituba. Para o MPF, a questão mais importante no momento é garantir que o território seja corretamente delimitado para que os direitos dos habitantes tradicionais seculares sejam assegurados.


“É isso que nós queremos. Esse direito”, afirmou, na ocasião, uma das lideranças indígenas Mura presentes: “Não queremos tomar nada de ninguém”.


Pressões, ameaças e informações falsas – Ainda na coletiva concedida na última sexta-feira (28), lideranças indígenas Mura relataram que são espalhadas informações falsas sobre supostas desapropriações na região, o que tem gerado conflitos e ameaças entre os comunitários. “A gente quer que isso seja resolvido pacificamente”, disse um dos representantes do povo Mura.


Durante inspeção judicial realizada em 2022, o MPF também colheu relatos de coação a moradores indígenas e não indígenas da região por pessoas ligadas à empresa para forçar a “venda” desses territórios tradicionais. Tais pressões, segundo relatos dos moradores, geraram insegurança alimentar pelo impedimento de acesso aos roçados tradicionais e a áreas de caça e pesca em pleno período de pandemia.


Um dos indígenas ouvidos afirma que “nasceu nessa terra e que não quer sair dela, onde tem agricultura, mas que já está cercado pelos lotes vendidos”. Ancião Mura, de 83 anos, informou ter recebido várias visitas de pessoas que supostamente representavam a Potássio do Brasil com o objetivo de comprar as terras em que vivia. Um desses representantes foi insistente e chegou a dizer que o indígena “tem que vender” e que, se não vender, “o senhor vai perder”.


Histórico de tratativas – O MPF no Amazonas passou a acompanhar o caso depois de receber informações de que a empresa Potássio do Brasil começou a realizar estudos e procedimentos na região sem qualquer consulta às comunidades. Em julho de 2016, o órgão expediu recomendação ao Ipaam, para que cancelasse a licença já expedida, e à Potássio do Brasil, para que suspendesse as atividades de pesquisa na região até a realização das consultas nos moldes previstos na legislação. Nenhum dos pedidos foi atendido.


O MPF constatou que, desde 2009, vinham sendo realizadas pesquisas de campo, autorizadas pelo então Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), para a identificação das jazidas dentro da Terra Indígena Jauary, sem que fossem consultadas as comunidades potencialmente atingidas. O estudo de impacto ambiental do empreendimento classificou-o como de porte “excepcional” e afirmou ser “muito alta” a interferência nos referenciais socioespaciais e culturais nas comunidades tradicionais e indígenas da região. A concordância em realizar as consultas nos moldes previstos pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) veio somente após o MPF levar o caso à Justiça, no entanto o acordo inicialmente feito foi violado pela empresa por diversas pressões ao povo Mura, o que levou o MPF a pedir multa judicial e adotar as medidas acima informadas.



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