A Zona Franca de Manaus têm indústrias atuando em 22 setores e atividades e diferentes políticas fiscais na cobrança de tributos. As alíquotas variam de acordo com o produto. Os incentivos fiscais incidem sobre o IPI (Importo sobre Produtos Industrializados), Imposto de Importação, ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), PIS e Cofins.
Os principais polos de produção, como o de duas rodas (motos, bicicletas e similares) e o de eletroeletrônicos (fogões, geladeiras, ar-condicionados) não têm concorrência com outros estados brasileiros.
No dia 25 de fevereiro o presidente Jair Messias Bolsonaro (PL) assinou o decreto 10.979/2022, que reduz de forma linear (25%), a cobrança do IPI para toda a indústria nacional. De acordo com especialistas, o IPI cobrado nos produtos da Zona Franca tem alíquotas variáveis. Em alguns casos a isenção é total.
Com a medida, políticos e empresários afirmam que o modelo econômico perderá competitividade e com o tempo tende a acabar, com a transferência das fábricas para outras cidades. Há quem defenda que a ZFM continua vantajosa e atrativa.
A receita total do PIM (Polo Industrial de Manaus) até novembro de 2021 foi de R$ 160,473 bilhões, com crescimento de 25,76% em relação a todo o ano de 2020. O faturamento foi de R$ 145,586 bilhões e, comparado a 2020, de janeiro a dezembro, o incremento foi de 21,08%.
Entre os segmentos que respondem pela maior parcela de faturamento, as indústrias do polo de eletro-eletronicos faturaram R$ 5,845 bilhões, 21,6% do total. O setor de duas rodas faturou, até novembro de 2021, R$ 3,453 bilhões, ou 12,76% do total.
São esses números que preocupam os que defendem a garantia constitucional do modelo econômico. O debate sobre perdas e ganhos se divide entre aqueles que decretam “a morte da Zona Franca” e os que advogam que o “modelo não será afetado”.
O debate
A discussão envolve economistas, políticos e entidades representativas das indústrias nacionais como a Eletros (Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos) e a Abraciclo (Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e Similares).
O economista Juarez Baldoíno da Costa afirma que não haverá perda de receita nem risco para a Zona Franca de Manaus. “Não modifica a opção técnico-econômica de fabricação de produtos”.
Na contra-mão da maioria dos segmentos envolvidos nos debates, que vêm se manifestando sobre a questão, Baldoíno afirma que a ZFM continua vantajosa, inclusive para novos artigos. “Preponderantemente, a escolha de produtos para fabricação na região é de artigos com alíquotas elevadas do IPI, combinada com as alíquotas do Imposto de Importação, entre outros fatores”, diz.
Baldoíno afirma que os produtos fabricados em Manaus têm um total de impostos menores do que os fabricados em outros locais do país por causa dos incentivos fiscais.
“Com menos impostos, os preços de venda são menores, e aumentam as vendas. Por esta razão é que muitas fábricas produzem no PIM [Polo Industrial de Manaus], que está dentro da ZFM. A ZFM é a soma das atividades do PIM, mais a atividade comercial e mais a atividade agropecuária”.
De acordo com o economista, os produdos fabricados em Manaus são tributados pelo PIS e Cofins em valor menor do que os produtos feitos fora de Manaus. Outro incentivo fiscal é a isenção do IPI, um dos principais que atraem as empresas. Estes mesmos produtos, se forem fabricados fora do Manaus, terão a cobrança do IPI embutida no preço e por isso serão mais caros.
“Não haverá nenhuma perda de receita porque os produtos do PIM já não pagam IPI por serem isentos e não vão diminuir as vendas porque os preços continuam iguais aos que eram antes do decreto”, afirma Baldoíno.
Para o economista, “os produtos que são fabricados fora do PIM é que poderão reduzir o preço de venda pela diminuição do IPI, o que permitirá até aumentar as vendas por ficarem mais baratos”. Seguindo a tendência do mercado, “se este produto já é fabricado em Manaus com preços menores, não deve haver produção expressiva a preços maiores fora do PIM” e por consequência não acarretará prejuízos para o modelo Zona Franca.
Pelos cálculos de Baldoíno, produzir no PIM produtos que até antes da publicação do decreto tinham alíquota de IPI de 15%, por exemplo, somados a outros fatores, custava para o atacadista comprador de fora da Zona Franca cerca de 23,8% a menos se fosse comprado de fabricante de fora da ZFM. Com o decreto 10.979, a vantagem de 23,8% cai para 19,7%, com redução de 4,1%. No caso de produtos que tinham alíquota de IPI de 35% a vantagem de produzir na ZFM cai de 40% para 31%, redução de 9%.
Fim da Zona Franca
O economista e deputado estadual Serafim Corrêa e o professor universitário e diretor adjunto da Fieam (Federação das Indústrias do Estado do Amazonas) Augusto César Barreto Rocha afirmam que os impactos financeiros do decreto 10.979/2022 sobre o faturamento da Zona Franca de Manaus não podem ainda ser calculados. Só com o tempo as perdas poderão ser estimadas.
“Não há como calcular. Dependemos de outros fatores que não são possíveis de medir [no momento]”, diz Serafim Corrêa.
“Impossível afirmar. A mudança de rumo afugenta. O afugentar não se sente em um ou dois dias”, afirma Augusto Barreto.
O professor Barreto Rocha diz que medidas recentes do governo federal já sinalizavam para o enfraquecimento da Zona Franca. Ele diz que com as perdas das vantagens, “contas que não eram mais feitas passarão a ser feitas rapidamente”, aumetando a possibilidade da instalação de novas indústrias em outros estados do Brasil e exterior. “Isso significa que é apenas mais um passo num desmonte e desmoronamento da Zona Franca”.
Barreto Rocha analisa que o empresário será levado a refletir sobre a permanência na Zona Franca, a partir da vigência do decreto. “Ao reduzir a vantagem de se estar em Manaus, é inevitável se perguntar: por qual propósito estou em Manaus se tenho tantas regras mais rígidas e benefícios decrescentes”, afirma.
E nesse processo de fuga de empresas e capital, o governo federal tem grande parcela de responsabilidade. “A ZFM não é mais política do governo do Brasil, mesmo que expresso na Constituição Federal. Porque não interessa mais”.
A opinião é compartilhada por Serafim Corrêa. “Quanto mais altas forem as alíquotas dos produtos, mais alta será a tendência das empresas que os fabricam virem para a ZFM porque aqui nada pagarão a título de IPI, enquanto fora da ZFM terão alta carga tributária. A decisão de vir ou de ficar depende da análise dos custos para produzir em Manaus para ver se os incentivos fiscais compensam permitindo às empresas um lucro maior”, diz.
Com o decreto, haverá saída de empresas, diminuição de empregos, redução de impostos e atividade comercial, diz Serafim. “Novas empresas não virão para produzir estes produtos”.
Serafim Corrêa afirma que as indústrias da Zona Franca recolheram em impostos mais de R$ 20 bilhões para o governo federal no ano passado. Augusto Barreto lembra que o conjunto de impostos incidentes sobre as atividades da Zona Franca torna o Amazonas um dos estados que mais recolhe tributos sem receber a devida contrapartida.
“Mesmo tendo um mega déficit de IDH [Índice de Desenvolvimento Humano] seguimos pagando mais impostos do que recebendo benefícios. Isso é terrível se pensarmos no preceito constitucional de redução das desigualdades regionais”, afirma Barreto Rocha.
Yamaha fábrica de Manaus
Fabricação de motocicletas é uma das principais atividades do Polo Industrial de Manaus (Foto: Divulgação)
Entidades
Entre as classes empresariais, 0 ATUAL consultou a Abraciclo, que reiterou nota publicada ainda no dia 25, mostrando “extrema preocupação com a redução linear da alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados para os produtos da Zona Franca de Manaus como as motocicletas e bicicletas”.
A Associação considera de fundamental importância excluir os produtos da ZFM da redução do IPI para a manutenção dos benefícios garantidos na Constituição Federal, assegurando a competitividade, incentivando a atração de novos investimentos, bem como a manutenção de empregos e renda na região Norte do País.
O Brasil é o sexto maior produtor global de motocicletas e o quarto maior de bicicletas. As indústrias instaladas no Polo Industrial de Manaus contam com 14,5 mil contratados diretos e cerca de três mil temporários.
A Eletros (Associação Nacional dos Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos) informo que que está “analisando os impactos do decreto que reduz o IPI para o setor de eletroeletrônicos e eletrodomésticos e está construindo soluções junto ao poder público para que seja preservada a garantia de excepcionalidade sobre os produtos produzidos na ZFM”.
A Eletros tem 33 empresas associadas no Brasil e 18 delas estão instaladas no Polo Industrial de Manaus.
As indústrias atuam em quatro segmentos do ramo eletroeletrônico e eletrodoméstico: ar condicionados e produtos das linhas branca (geladeiras, fogões, lavadoras de roupa e micro-ondas, principalmente); marrom (TVs e equipamentos de áudio e vídeo); e portátil (liquidificadores, batedeiras, ventiladores, cafeteiras, secadores de cabelo e aspiradores de pós, dentre outros).
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